Uma mudança anunciada nesta quarta-feira (1º) promete sacudir a vida de milhões de brasileiros. O governo federal publicou uma norma que proíbe beneficiários do Bolsa Família e do BPC (Benefício de Prestação Continuada) de se cadastrarem ou continuarem em sites de apostas esportivas, as famosas bets.
A regra é clara: se o CPF estiver vinculado a um desses programas sociais, a conta será bloqueada automaticamente. A justificativa do governo é proteger famílias em situação de vulnerabilidade do risco do endividamento.
A medida é resposta aos dados chocantes revelados pela CPI das Bets e pelo Banco Central no ano passado. Os relatórios apontaram que cerca de 5 milhões de beneficiários do Bolsa Família teriam movimentado R$ 3 bilhões em apostas em apenas um mês, boa parte via Pix.
O dado acendeu um alerta em Brasília: dinheiro público destinado à sobrevivência mínima estaria sendo desviado para apostas online, muitas vezes alimentando ciclos de ilusão e endividamento.
Quem aposta no Brasil?
O perfil do apostador brasileiro, segundo o Banco Central e relatórios recentes, mostra que o jogo está muito longe de ser apenas ‘diversão’. A maioria dos apostadores está nas classes C e D, com renda familiar entre R$ 3 mil e R$ 6 mil. Mais de 60% deles já têm algum tipo de dívida ou atraso em contas básicas.
Um levantamento da Paag mostra que 90% das apostas no Brasil são de menos de R$ 100, mas feitas com tanta frequência que viraram rotina, especialmente entre jovens e chefes de família.
Pesquisas ainda apontam que mais de 10,9 milhões de brasileiros vivem hoje em situação de jogo problemático, quando a aposta traz prejuízos à vida pessoal, familiar e financeira — número que cresce ano após ano.
Como vai funcionar o bloqueio?
A norma criou o Sistema de Gestão de Apostas (Sigap), onde as plataformas terão de consultar cada CPF. Se o documento aparecer marcado como ‘Impedido – Programa Social’, o acesso será encerrado.
O dinheiro que restar nas contas será devolvido. Caso não seja resgatado em até dois dias, ficará retido e, após 180 dias, será enviado ao Fies (financiamento estudantil) ou ao Funcap (fundo de calamidades públicas).
Um cerco que vem se apertando
Essa não é a primeira restrição. Em 2025, o governo já havia proibido o acesso de menores às plataformas e apertado a fiscalização sobre o setor. O Senado também aprovou um projeto que limita propagandas de apostas com influenciadores e atletas, para reduzir o apelo sobre jovens e famílias de baixa renda.
Além disso, a Receita Federal determinou que ganhos em apostas passem a ser tributados na fonte.
Entre proteção e polêmica
Para o governo, a medida é proteção. Mas para críticos, ela abre um debate incômodo: até que ponto o Estado pode intervir nas escolhas pessoais dos cidadãos?
Na prática, o bloqueio atinge uma parcela gigantesca da população que, entre a ilusão do ‘lucro fácil’ e a realidade do desemprego e da falta de oportunidades, via nas bets uma chance — ainda que arriscada — de mudar de vida.
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